Milton Cunha diz que não perdoou os pais por ter sofrido homofobia
Carnavalesco, cenógrafo e comentarista da TV Globo participou do Papo de Segunda, na GNT, e relembrou alguns traumas e dificuldades que passou na infância.
O carnavalesco, cenógrafo e comentarista Milton Cunha participou do Papo de Segunda de ontem, na GNT, e relembrou alguns traumas e dificuldades que passou na infância devido a sua orientação sexual, em específico sobre a não aceitação de seus pais.
Abertamente gay, Milton viveu até os 19 anos em Belém, cidade em que nasceu, antes de se mudar para o Rio de Janeiro e iniciar na carreira artística e no carnaval carioca. Durante o tempo que passou na cidade portuária do Pará, ele contou ter sofrido com a sua família.
“Lembro do meu pai com uma ternura enorme porque sei que ele não conseguia lidar com o que eu era, e acreditem, eu era”, conta ele, se referindo ao genitor como um homem sem repertório cultural e emocional, que não o entendia porque fugia dos padrões aceitáveis de uma época, lugar e situação.
“Quando você nasce uma ‘bichinha’, em um lugar onde você é o afeminado da parada, você olha os adultos ao redor e diz: ‘ferrou, estou sozinho e ninguém gosta de mim’. A porrada vem de todos os lados; do vizinho, na escola? é de uma solidão fantástica”, relembra o comentarista de escolas de samba da Rede Globo.
“Veja bem, meu pai trabalhava com lanternagem de carro em oficina, vivia cheio de graxa, gostava de jogo de futebol, amigos, aquela loucura toda. Então ele me dizia: ‘Teus olhos não me enganam’ [se referindo ao fato de ser gay]. E eu respondia: ‘Mas não quero te enganar'”.
Durante a entrevista, Milton ainda revelou que, mesmo após décadas, não perdoou os pais pelo passado. “Dez anos depois [que sai de Belém], uma década se passou, e eles me ligavam para dizer ‘Eu te perdoo”, e eu respondia: ‘Não, quem não perdoa vocês sou eu. Eu não perdoo vocês”, afirmou.
“A gente vai levando. É o que tem pra hoje, né, mas se eu perdoei eles? Isso é complicado”, concluiu.
Com início carnavalesco na Beija-Flor, em 1994, Milton também recordou do momento em que tudo mudou, quando deixou a sua cidade natal logo após terminar a universidade de psicologia, em 1982, para correr atrás do sonho. Com apenas 19 anos, R$ 100 no bolso e sem conhecer ninguém no “Rio Maravilha”, como o próprio nomeia a capital carioca, viajou sem medo e sem olhar para trás.
“Quando anunciei que ia embora, meus pais não acreditaram”, contou ele. “Mas quando desci a escada de casa no horário de pegar o ônibus e vi meu pai sentado na sala, pensei: ‘agora o pau vai comer’. Mas não, foi ao contrário; ele fez questão de me levar até a rodoviária de carro”.
“Entramos no Fusca e fomos os dois chorando. Quando chegamos, ele me disse: ‘Você está fazendo o que eu devia ter feito quando tinha a sua idade’. Eu, sem olhar, disse antes de bater a porta do carro e sair: ‘Perdeu. Você não fez e eu estou fazendo agora”, relembrou.