Grupo invade TCC de estudante da UnB e exibe vídeos de ataques homofóbicos
Imagens de pessoas sendo espancadas e de bandeiras LGBTQIA+ queimadas foram sobrepostas ao Trabalho de Conclusão de Curso. 'Disseram que não teria TCC de gay', contou aluno; universidade repudiou ato e disse que vai acionar Polícia Federal.
A apresentação de um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de um aluno da Universidade de Brasília (UnB) virou alvo de ataques LGBTfobicos. O episódio aconteceu nesta segunda-feira (7), enquanto o estudante de jornalismo Allan Michael Montalvão, de 23 anos, mostrava à banca examinadora o resultado da sua pesquisa sobre gênero, sexualidade e mercado de trabalho.
Durante a apresentação, cerca de seis perfis invadiram a transmissão. “Eles compartilharam na tela vídeos de pessoas sendo espancadas e de bandeiras LGBTQIA+ sendo queimadas”, disse Allan. “Com cinco minutos de apresentação, sofri esse ataque. Na hora, não entendi, porque estava olhando meu slide, compartilhando a tela”.
“Do nada, começou uma voz alterada, meio robótica, falando que era para encerrar a chamada, que não teria TCC de gay.”
Em nota, a UnB repudiou os ataques de “homofobia e de transfobia”, disse considerar o caso “extremamente grave” e, por isso, vai acionar a Polícia Federal (veja mais abaixo), o que não havia ocorrido até a publicação desta reportagem.
Devido à pandemia do novo coronavírus, as aulas presenciais estão suspensas na universidade. Allan contou que usava uma plataforma online aberta para apresentar o trabalho, para que outros estudantes da instituição interessados no tema pudessem acompanhar.
O estudante acredita que o ataque foi direcionado ao tema do TCC, que trata sobre mercado de trabalho para pessoas LGBTQIA+.
“A gente recebe uma tabela com todos os links das apresentações. É comum que outros alunos interessados nos temas acompanhem. Todos conseguem ver meu nome e sobre o que é o trabalho”, explicou.
Denúncia
Em nota, o Conselho da Faculdade de Comunicação da UnB disse que o ataque ao trabalho do estudante foi uma forma de tentar “intimidar a produção científica”, além de afastar pessoas e a temática LGBTQIA+ “de conhecimento, da construção coletiva da esfera pública e da sua afirmação enquanto sujeitos”.
O Conselho informou ainda que se reuniu nesta segunda-feira e decidiu formalizar o caso junto à Secretaria de Tecnologia da Informação da UnB e ao Gabinete da Reitora, para que o caso possa ser investigado pela Polícia Federal.
Allan contou que aguarda o posicionamento da instituição de ensino para procurar as autoridades policiais. O estudante solicitou o vídeo da transmissão à instituição e disse que vai avaliar se será necessário acionar a Polícia Civil.
Aprovação
Após os ataques, Allan e os professores deram continuidade à avaliação e criaram outra sala virtual para a apresentação do TCC, porém, dessa vez a transmissão era fechada.
“Depois de muito trabalho e muito problema, fui aprovado”, comentou o estudante.
Na pesquisa do TCC, o estudante de jornalismo reuniu depoimentos de diversos profissionais LGBTQIA+ que atuam na televisão.
Allan conta que nunca foi perseguido na UnB devido à própria sexualidade e acredita que o ataque tenha sido motivado justamente pela temática do trabalho.
“Fiquei muito surpreso. Não imaginei que algo fosse acontecer por conta de um TCC”, disse.
Lei anti-homofobia
Em 20 de novembro, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram, por unanimidade, pela garantia da aplicação da lei anti-homofobia no Distrito Federal. A lei prevê punição de até R$ 10 mil em casos de intolerância.
O assunto foi parar no STF depois que a bancada evangélica da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) derrubou um decreto do ex-governador Rodrigo Rollemberg (PSB), que buscava regulamentar a lei 17 anos depois de aprovada.
Na decisão, a ministra Carmen Lúcia, que foi relatora do processo, criticou a ação da CLDF.
“Tal prática da Câmara Distrital atenta contra os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade, e importa inaceitável retrocesso social na proteção contra condutas discriminatórias em razão da orientação sexual das pessoas no Distrito Federal”, disse Carmen Lúcia.