O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) foi condenado, nesta quarta-feira, em processo movido pela também parlamentar Duda Salabert (PDT-MG). Em 2020, quando os dois ainda eram vereadores de Belo Horizonte, o bolsonarista deu uma entrevista na qual se referiu a Salabert com pronomes masculinos. Por este motivo, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) decidiu pela condenação, em primeira instância, e impôs indenização no valor de R$ 80 mil.
Em novembro de 2020, ao jornal Estado de Minas, Ferreira afirmou:
— Eu ainda irei chamá-la de ‘ele’. Ele é homem. É isso o que está na certidão dele, independentemente do que ele acha que é.
Após a declaração, a então vereadora entrou com uma ação por injúria racial e indenização por danos morais, julgada procedente pelo TJMG.
“Assim, se as pessoas transgênero têm direito de se apresentar à sociedade da forma como se enxergam, logo, também têm direito de ser tratadas e respeitadas por terceiros de acordo com sua identidade de gênero. A negativa de reconhecimento da identidade de gênero configura, portanto, ato ilícito passível de responsabilização por dano moral”, diz trecho da sentença.
Ao longo da peça, a Justiça destaca que sexo biológico e identidade de gênero não estão correlacionadas e que a transexualidade deve ser respeitada: “No caso dos autos, a autora, conhecida professora e ativista pelos direitos dos transexuais em Belo Horizonte e no Brasil, de vez que eleita deputada federal nas eleições de 2022, vem há anos se apresentando perante a sociedade como mulher, tendo, inclusive, alterado seu assentamento civil para constar mudança de nome e sexo para o feminino”.
A reincidência no tratamento com pronomes masculinos também é destacada pelo juiz José Ricardo dos Santos de Freitas Véras, da 33ª Vara Cível.
“Os fatos narrados são incontroversos e estão acompanhados de documentos que comprovam as palavras proferidas pelo requerido que, por sua vez, não nega os acontecimentos, mas sustenta estar amparado pelo direito à liberdade de expressão e à manifestação religiosa. Contudo, tais direitos, assim como todos os direitos fundamentais, não são absolutos e podem ser restringidos quando colidirem com outros direitos”, afirma o magistrado.
Nas redes sociais, Salabert celebrou a decisão:
“Se não aprendeu na família e na escola, aprenderá na justiça a respeitar as travestis”, escreveu a deputada.
Discurso transfóbico na tribuna
A decisão do TJMG ocorre um mês após o discurso transfóbico do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) no Congresso Nacional. O ex-vereador de BH usou a tribuna no dia 8 de março para, em tom de deboche, afirmar que se “sentia mulher”, tendo “lugar de fala” para discursar sobre a efeméride — o Dia Internacional da Mulher.
— Hoje, me sinto mulher. Deputada Nicole. As mulheres estão perdendo seu espaço para homens que se sentem mulheres. Para vocês terem ideia do perigo que é isso, eles estão querendo colocar a imposição de uma realidade que não é a realidade — disse o parlamentar.
O caso ganhou projeção nacional e deputados da oposição pediram a cassação de Ferreira na Comissão de Ética da Câmara dos Deputados. Como antecipado pelo colunista Ancelmo Gois, o ato também é tema de pelo menos cinco ações que correm no Supremo Tribunal Federal (STF).