O Supremo Tribunal Federal decidiu que as redes de ensino pública e privada são obrigadas a tomar medidas para combater, no ambiente escolar, a discriminação de crianças e adolescentes por gênero e orientação sexual – por exemplo, o bullying LGBTfóbico.
A questão foi definida em plenário virtual, e o julgamento terminou nesta sexta-feira (28).
Prevaleceu o posicionamento do relator do caso, ministro Edson Fachin, relator de uma ação do PSOL sobre o tema. O ministro Nunes Marques divergiu.
O partido questionou pontos do Plano Nacional de Educação, aprovado em lei em 2014. A sigla sustentou que é preciso garantir que as escolas ensinem crianças e adolescentes a conviverem com a diversidade, em uma sociedade plural.
Fachin argumentou que o texto do PNE traz, como uma de suas diretrizes, a erradicação de todas as formas de discriminação – mas é necessário deixar mais claro que isso implica combater, também, discriminações de gênero e orientação sexual.
A ideia é evitar uma “insuficiência de proteção” a direitos constitucionais.
“Entendo fazer-se necessária a explicitação, no Plano Nacional de Educação, de que a lei está orientada para a finalidade de combate às discriminações de gênero e de orientação sexual, porquanto todo déficit de clareza quanto a estes objetivos conduz a um correspondente decréscimo de adequação técnica da norma”.
Fachin votou, então, para “reconhecer a obrigação, por parte das escolas públicas e particulares, de coibir as discriminações por gênero, por identidade de gênero e por orientação sexual, coibindo também o bullying e as discriminações em geral de cunho machista (contra meninas cisgêneras e transgêneras) e homotransfóbicas (contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais)”.
Os ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso acompanharam integralmente a posição do relator, assim como a ministra Cármen Lúcia.
Os ministros Cristiano Zanin, Gilmar Mendes, André Mendonça e Flávio Dino também entendem que as escolas devem atuar para combater as discriminações, mas foram além.
Fixaram, nos votos, que isso deve ocorrer de acordo com orientações pedagógicas, com a “adequação do conteúdo e da metodologia aos diferentes níveis de compreensão e maturidade, de acordo com as faixas etárias e ciclos educacionais”.
Nunes Marques diverge
O ministro Nunes Marques divergiu. Votou para rejeitar a ação, considerando as diretrizes do PNE constitucionais. Marques entendeu que o tema é de competência dos Poderes Executivo e Legislativo.
“Para além de diploma normativo, há arcabouço legal, que trata do Plano Nacional de Educação, de forma detalhada, o que indica que o debate sobre tais questões deve ser feito, de forma primordial, pelo Legislativo e, posteriormente, pelo Executivo, por seu respectivo Ministério da Educação”, ponderou.
“Adentrar em tal seara, a meu sentir, é se distanciar do Princípio da Separação dos Poderes. Antes, ao Judiciário compete conviver de forma harmônica com os demais Poderes, Legislativo e Executivo. Ademais, as diversas questões envolvendo o tema da educação em escolas públicas e particulares é altamente complexo e multifacetário, a indicar que compete aos Poderes Legislativo e, posteriormente, ao Executivo, tratar tal matéria”, acrescentou.
Lei de Blumenau sobre “ideologia de gênero”
A Corte também invalidou uma lei de Blumenau (SC) que proibiu a inclusão das expressões “ideologia de gênero”, “identidade de gênero” e “orientação de gênero” em qualquer documento relacionado ao Plano Municipal de Educação.
A maioria dos ministros seguiu o voto do ministro Edson Fachin, que também é o relator deste caso.
“Figura-me inviável e completamente atentatório ao princípio da dignidade da pessoa humana proibir que o Estado fale, aborde, debata e, acima de tudo, pluralize as múltiplas formas de expressão do gênero e da sexualidade”, afirmou o ministro.
“O enclausuramento em face do diferente furta o colorido da vivência cotidiana, privando-nos da estupefação diante do que se coloca como novo, como diferente. É somente com o convívio com a diferença e com o seu necessário acolhimento que pode haver a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, em que o bem de todos seja promovido sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, completou.
Seguem o posicionamento os ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, Luís Roberto Barroso.
Os ministros André Mendonça e Nunes Marques seguiram o relator, mas ressaltaram que a inconstitucionalidade ocorre por invasão da competência da União para legislar sobre o tema.