
Um levantamento inédito realizado pela Nexus – Pesquisa e Inteligência de Dados revela um cenário complexo e, em parte, surpreendente sobre a legislação relacionada a pessoas trans no Brasil. Ao contrário da percepção de um avanço puramente restritivo, o estudo aponta que a maioria dos projetos de lei (PLs) apresentados nas assembleias legislativas estaduais e do Distrito Federal entre 2015 e 2025, na verdade, busca ampliar direitos.
Dos 664 projetos identificados na última década, 416 (62,6%) têm como objetivo garantir ou reforçar prerrogativas para a população trans. Em contrapartida, 248 propostas (37,3%) visam restringir ou suprimir esses direitos. A pesquisa mostra que, na prática, a agenda pró-direitos tem sido mais bem-sucedida: foram aprovadas 21 leis favoráveis, mais que o dobro das 9 leis com teor restritivo que vigoraram no período.
Os temas mais recorrentes nos projetos de expansão de direitos são segurança pública (54 PLs), a garantia do uso do nome social (53) e a inclusão no mercado de trabalho (38). Já as propostas restritivas focam em pautas de grande apelo no debate conservador, como educação (69), com destaque para iniciativas ligadas ao movimento “Escola sem Partido”, esportes (38), saúde (35) e o uso de banheiros (32).
Polarização ideológica e concentração geográfica
O estudo evidencia uma forte polarização ideológica na autoria dos projetos. Entre parlamentares de partidos de esquerda, 99% das propostas são favoráveis aos direitos trans. Já no espectro da direita, 84% dos projetos apresentados buscam restringi-los. O ano de 2023 foi o mais movimentado, concentrando 218 propostas, quase um terço de todo o volume analisado na década.
Apesar da nítida divisão, há exceções. O levantamento aponta que 37 dos projetos favoráveis (9% do total) partiram de deputados de direita. Um exemplo é a deputada Socorro Pimentel (União Brasil), autora de três leis aprovadas em Pernambuco, estado que lidera o ranking de legislação favorável à população trans no país, com quatro leis sancionadas.
Geograficamente, a atividade legislativa se concentra no Sudeste. As assembleias de São Paulo (Alesp) e do Rio de Janeiro (Alerj) são responsáveis por 42% de todos os projetos sobre o tema no Brasil. Na outra ponta, estados como Tocantins e Rondônia apresentaram apenas uma proposta cada em dez anos.
Atualmente, 265 projetos favoráveis e 162 restritivos ainda estão em tramitação nas casas legislativas, indicando que o embate sobre o tema seguirá nos próximos anos.