Baile faz apelo para que pessoas LGBT idosas não voltem para o armário
Enquanto centenas de convidados subiam uma escadaria nas cores do arco-íris na Prefeitura de Melbourne, na Austrália, Tristan Meecham corria de um lado para outro pelo saguão, abraçando uma mulher que chegava de máscara dourada, beijando no rosto um cavalheiro de smoking, e soltando gritos de animação.
Ele se abanava vigorosamente, tudo isso equilibrando-se sobre um salto agulha de 15 cm.
A festa, realizada em uma noite de sábado em outubro, era o Coming Back Out Ball (algo como “baile para sair do armário de novo”), um evento idealizado por Meecham, 34, em homenagem a gays, lésbicas, travestis e transexuais mais velhos.
Chegavam convidados de todos os cantos do país. Alguns vieram com parceiros de mais de 30 anos, e outros tinham acabado de sair do armário aos 70, 80 anos de idade.
O baile veio em um momento importante para a comunidade LGBT na Austrália, uma vez que o país aguarda os resultados de uma pesquisa por correio sobre se o casamento entre pessoas do mesmo sexo deve ser legalizado.
Meecham, o diretor artístico da companhia performática “All the Queens Men”, disse que o evento era um presente para aqueles que foram os precursores. Ele disse que o baile era também uma tentativa de evidenciar uma questão raramente discutida: a tendência de pessoas LGBT esconderem parte de suas identidades quando vão para asilos ou recebem cuidados em casa.
Muitos australianos LGBT mais velhos sofreram décadas de discriminação, violência sexual e física, além de tratamento médico ou psicológico forçado. Alguns ainda são fichados na polícia por conta da orientação sexual ou identidade de gênero. (As últimas leis contra a população LGBT na Austrália foram revogadas em 1997.)
Pessoas LGBT mais velhas estão acostumadas a esconder suas diferenças corporais ou sexuais para se protegerem, disse Catherine Barrett, uma pesquisadora especializada em cuidados da terceira idade e ativista. Ela diz que para alguns LGBTs idosos, sua última experiência com o sistema de saúde pode ter sido uma visita forçada a uma instituição décadas atrás, e que essas experiências podem tornar difícil para eles se sentirem seguros.
Durante o baile, os convidados puderam assistir a uma noite de cabaré, drags e ópera ao longo de um jantar de três pratos.
Muitos se “montaram”, como um homem que foi vestido de Liberace, mas Brian Day, 77, disse que preferia usar sua nova “trackie-daks”, ou calça de moletom. Em sua camisa de flanela ele levava pregada sua medalha da Ordem da Austrália, concedida por seus serviços durante a crise da Aids e no movimento dos direitos LGBT. Quando começaram as danças, ele assistiu batendo os pés.
Ele disse que às vezes seu corpo fica dolorido. “Fui espancado três vezes em minha vida adulta, inclusive dentro de meu apartamento, minha própria casa”, conta Brian. “O mundo é violento para nós”.
Embora atualmente ele viva sem preocupações, entende por que algumas pessoas podem voltar para dentro do armário. Ele disse que as instituições têm sido “violentas conosco”, e que ainda fica tenso quando passa por um policial.
“Não temos tanta energia quanto costumávamos ter. E não queremos entrar em brigas. Só queremos viver em paz agora, por favor”, ele disse.
Ele também teme que os serviços para os idosos não estejam preparados para lidar com a angústia persistente de pessoas LGBT mais velhas, especialmente com o trauma da epidemia de Aids.
“Nós passamos por 25 anos vendo nossos amigos morrendo um atrás do outro…”, ele disse. “Como as pessoas vão lidar comigo, com minha tristeza?”
Mais tarde naquela noite, Jean Taylor, 73, escritora e ativista desde os anos 1970, foi sentir o ar fresco da noite sentada em um banco do lado de fora da prefeitura, observando os pedestres na movimentada Swanston Street junto com sua companheira Ardy Tibby, 76. Taylor disse que achava que as lésbicas sempre seriam “cautelosas” ao se assumirem, mas que elas precisavam “ser um pouco corajosas” e não “presumir que todos os asilos são inseguros”.
Taylor, uma autodenominada “dona de casa e mãe de duas feministas lésbicas radicais”, disse que o baile era uma boa celebração, mas manifestou sua decepção com o fato de que boa parte da história lésbica feminista local havia se “perdido”.
Depois que os pratos do jantar foram retirados, Meecham fez um discurso para a plateia. “Aos LGBTI mais velhos que foram os precursores, que ajudaram a moldar nossa comunidade, que lutaram pelo meu direito de usar estes saltos de 15 cm e esmalte dourado: a vocês, meu obrigado. Todo meu respeito por vocês”.
Em seguida, Meecham pulou do palco com o microfone e puxou os convidados de suas cadeiras um por um, convidando-os a contarem suas histórias.
“Eu sempre digo que armários são para roupa e naftalina, e só”, disse Gordon Wilson, um gay de 80 e poucos anos.
Ao som de “I Wanna Dance With Somebody”, duas mulheres de cabelos brancos começaram a dançar uma valsa. Uma delas permanecia ereta, com os cotovelos para fora e o rosto fixo em uma expressão formal. Elas rodopiavam em um semicírculo de um lado para outro. Sua companheira se apoiava no peito de sua parceira e sorria, permitindo-se ser conduzida pelas margens da pista de dança.
Tradução: GAY1