Política

Justiça condena ex-deputado bolsonarista em R$ 100 mil por discursos de ódio contra LGBTs

Victório Galli, de Mato Grosso, terá de pagar quantia que será destinada a uma organização que combata a violência e discriminação praticada contra pessoas LGBT.

Victório Galli, de Mato Grosso, é condenado por manifestações homofóbicas e terá de pagar indenização de R$ 100 mil. (Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados)
Victório Galli, de Mato Grosso, é condenado por manifestações homofóbicas e terá de pagar indenização de R$ 100 mil. (Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados)
A Justiça de Mato Grosso condenou o ex-deputado federal Victório Galli por causa de manifestações homofóbicas. Ele terá de pagar uma indenização por danos morais de R$ 100 mil, valor que será destinado a uma entidade que combata a violência e a discriminação praticada contra pessoas LGBT. A organização será indicada pelo Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual.

O discurso de ódio contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais sempre esteve presente nas falas de Galli, segundo a ação civil ajuizada contra o ex-deputado.

Para a Defensoria Pública de Mato Grosso, responsável pelo pedido, ‘a atuação política do professor de teologia se limita a categorizar, inferiorizar e ridicularizar’ pessoas LGBT.

A defesa do ex-deputado alega que Galli tem o direito de se manifestar e provocar o debate público, de acordo com ‘seus valores pessoais motivados pelas mais diversas razões’.

Em sua decisão, a juíza Célia Regina Vidotti, da Vara Especializada em Ação Civil Pública e Ação Popular da Comarca de Cuiabá, destacou que a liberdade de expressão e da livre manifestação do pensamento ‘não pode ser utilizada de forma abusiva’.

Segundo a magistrada, esse direito deve ser exercido ’em observância à proteção da dignidade da pessoa humana, de maneira a não humilhar, inferiorizar ou ridicularizar’.

A sentença apresenta parte de uma entrevista do ex-deputado à rádio Capital FM, transcrita para exemplificar suas manifestações preconceituosas.

Os trechos destacados mencionam que ‘o Mickey e a Disney fazem apologia ao homossexualismo’ e que a empresa passa uma ‘mensagem subliminar’ à sociedade, principalmente às crianças.

Na entrevista, Galli diz que no filme ‘O Rei Leão’, o animal ‘deveria ser feroz’ e não ‘animalzinho frágil’. Com essa fragilização, sustenta o ex-parlamentar, o ‘homem deixaria de ser homem’, ‘desonrando a sua natureza de macho’.

Segundo a juíza, há ‘excesso’ quando o deputado afirma que os personagens infantis são ‘gays’, ‘fazem apologia ao ‘gayzismo’’ e ‘difamam’ a família tradicional.

“O errado é que a pessoa tá fazendo apologia. Eu não sou contra ninguém ser gay, meu filho, eu não sou contra ninguém ser lésbica. […] Tirando a natureza, a natureza do homem e da mulher, desde que a pessoa tenha 18 anos, faça isso entre quatro paredes e não faz apologia”, diz o ex-deputado na entrevista.

O professor de teologia faz ainda referencia as mulheres travestis e transexuais na gravação.

“Onde é que se viu há tempos atrás homem usar saia, homem vestir roupa de mulher, vestir sutiã, deixar o peito crescer, faz tudo querendo ser mulher? Onde que via isso lá atrás? Estão chamando isso de modernidade. Isso é sem-vergonhice. Entendeu? Homem tem que ser homem. Mulher é mulher”, afirma Galli.

A ação destaca vídeo gravado em um aeroporto, no qual, em companhia do então senador Cidinho Santos (PR/MT), o ex-deputado afirma: “Não, e agora estão lançando mais um novo filme deles que é a fera, a Bela e a Fera, que é gay também, tudo… Deus me livre!”.

O ex-deputado diz que não foi ele quem gravou o vídeo e que ‘trata-se de uma brincadeira’ de Cidinho.

Na avaliação da juíza, as declarações de Galli ‘estão carregadas de preconceito, de repúdio e representam um julgamento do ‘certo’ e do ‘errado’, quando se refere às pessoas homossexuais’.

Em uma publicação no facebook, o ex-deputado se pronunciou sobre a condenação.

“Eu disse verdades e não irei retirar nenhuma vírgula. Eu tenho minhas crenças, meus valores e a Constituição Federal me resguarda o direito de ter minha religião respeitada. E, naquela ocasião eu estava garantido pelo direito de opinião e imunidade parlamentar de fala. E nunca desejei o mal para qualquer pessoa, como cristão e pastor irei orar por essas pessoas”, afirmou Galli.

Dois momentos do mandato de Galli como representante do PSC na Câmara foram destacados na ação.

Segundo a Defensoria, o ex-deputado afirmou que defenderia um ‘projeto de lei que prevê a possibilidade de líderes religiosos questionarem e criticarem a homossexualidade dos cidadãos, sem estarem sujeitos a penalidades por homofobia’.

A fala do ex-parlamentar faz referência ao Projeto de Lei 6314/2005, que propõe a exclusão do crime de injúria e difamação quando for opinião de professor ou ministro religioso.

O ex-deputado afirma que o projeto dá o direito ao professor, pastor e padre, a ‘fazer o contraponto em suas pregações’.

“O homossexualismo é pecado, está escrito na bíblia. Tem que amar o pecador, mas não pode ser a favor do pecado”, diz.

Em 2016, o ex-deputado apresentou ao plenário da Câmara o Projeto de Lei n.º 5774/2016, que propõe criminalizar o uso de banheiros públicos por pessoas trans.

Questionado sobre o tema, ele fez uma suposição: “Se você tivesse uma filha de 12 anos, que entrasse no banheiro e junto entra um homem dizendo que é gay, quer ser mulher, urinando junto com ela, você ia ficar feliz?”

Em uma de suas últimas manifestações no plenário, em novembro de 2018, o professor de teologia repudiou a inclusão de uma questão a respeito do dialeto usado por LGBTs – o pajubá – no Exame Nacional do Ensino Médio.

O ex-deputado confirma que é contra o projeto: “Será que tem tanta coisa de cultura nossa e vamos ensinar dialeto de ‘gay’, ‘traveco’, de ‘travesti’ pras nossas crianças?”

Galli se candidatou novamente para uma cadeira na Câmara, desta vez filiado ao PSL. O professor de teologia teve 52.947 votos mas não foi reeleito.

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