Falta amparo legal para filhos de casais do mesmo sexo, dizem participantes de audiência
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
Maria Berenice Dias (2ª à esquerda): lacunas na legislação prejudicam principalmente as crianças.
Crianças com casais formados por pessoas do mesmo sexo são cada vez mais comuns na sociedade, mas essa realidade ainda é parcialmente ignorada pelo Estado. A falta de amparo legal foi queixa que se sobressaiu em audiência pública sobre as novas configurações de família, realizada nesta quinta-feira (12) pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). De acordo com o IBGE, há mais de 60 mil famílias formadas por casais do mesmo sexo no Brasil.
A aprovação pelo Congresso Nacional de um Estatuto da Diversidade Sexual foi defendida durante o debate. Um anteprojeto sobre o tema, elaborado pela Comissão Especial da Diversidade Sexual do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), está em fase de coleta de assinaturas. O texto da proposta está disponível em: http://www.estatutodiversidadesexual.com.br/.
O objetivo do anteprojeto é garantir direitos fundamentais que não estão sendo respeitados. Foi o que afirmou a presidente da Comissão Especial da Diversidade Sexual do Conselho Federal da OAB/RS, Maria Berenice Dias. Segundo ela, mesmo depois do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu as uniões homoafetivas como entidade familiar, ainda existem lacunas na legislação o que prejudica principalmente as crianças.
“O Estado não está garantindo a essas crianças seu direito à cidadania. Temos uma inconstitucional afronta ao direito de identidade” disse Maria Berenice Dias, ao comentar a necessidade de casais ingressarem na Justiça para garantir o registro de crianças com os nomes de dois pais ou duas mães.
A fim de acelerar a análise do anteprojeto, a presidente da CDH, senadora Ana Rita (PT-ES), disse que a comissão está à disposição para que a proposta seja apresentada na forma de sugestão da OAB ao colegiado. A sugestão é uma modalidade de participação política da sociedade prevista no Regimento Interno da Casa.
“A adoção de crianças por casais homossexuais apesar de possível ainda não está regulamentada. O reconhecimento de dupla maternidade ou dupla paternidade também não. Apesar de haver jurisprudência, os processos demoram e podem envolver altos custos, além de desgaste para garantir o que é da criança por direito” observou Ana Rita.
Conceito de família
Segundo o subprocurador-geral da República Luciano Mariz Maia, os entendimentos do Direito sobre o conceito de família precisam evoluir.
“Se por um lado o conceito de família é socialmente construído, esse conceito não é estável. Esse conceito necessariamente precisa se abrir para as novas configurações sociais. Temos dificuldade hoje por conta do preconceito” afirmou.
PLC 122
A demora na aprovação de leis que têm como objetivo combater o preconceito também foi motivo de críticas. Debatedores disseram que em um país laico a influência de grupos religiosos não pode ser impedimento para aprovação de projetos como o PLC 122/2006, que torna crime a discriminação ou o preconceito pela orientação sexual e de identidade de gênero. Gustavo Bernardes, coordenador de Promoção dos Direitos de LGBTs da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, elogiou a senadora Ana Rita e o senador Paulo Paim (PT-RS) pela leitura do relatório sobre o projeto na quarta-feira (11).
“Quando esse PLC for aprovado e finalmente virar lei, vai reforçar no ordenamento jurídico a vedação aos comportamentos discriminatórios e preconceituosos tanto por parte do cidadão como por parte do Estado brasileiro. Ainda temos um estado extremamente homofóbico” avaliou.