A presidente da Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), Keila Simpson, foi impedida de entrar no México, neste domingo (1º), por sua expressão de gênero não corresponder ao nome em seus documentos. A brasileira, que é uma mulher trans, viajou a trabalho para participar de um fórum mundial para falar sobre direitos LGBTQIA+ no Brasil. Como ainda não tem a identidade de gênero retificada oficialmente, ficou detida pelas autoridades mexicanas e, em seguida, foi colocada em um voo de volta para São Paulo.
Keila afirma que ficou cerca de dez horas sem comunicação dentro do aeroporto internacional da Cidade do México. Além da detenção, teve os telefones confiscados. “Tomaram meus dois aparelhos. Eu fiquei incomunicável. Muito tempo depois, me deram direito a uma ligação de um minuto. Parece uma prisão. Você fica sendo vigiada por dois policiais. E depois me colocaram em um avião e me mandaram de volta”, disse em entrevista ao site Universa. Keila pousou no Brasil na manhã desta segunda-feira (2).
Keila foi detida ao desembarcar no país mesmo estando de posse de visto liberado e com reserva coletiva da delegação que participaria do evento internacional. Segundo ela, as autoridades mexicanas cobraram reserva pessoal (a dela era coletiva) no nome que está registrado em seus documentos.
“Eu fui lá desenvolver um trabalho, com tudo certo. Tinha o visto eletrônico, o passaporte, bilhete de entrada e saída online (mas eles queriam o físico), e a minha reserva no hotel, que era coletiva porque era uma delegação que estaria lá. Não tinha uma reserva específica no meu nome e eles estavam pedindo isso”, afirmou.
Keila também afirma que pretende entrar na justiça: “Vamos entrar em contato com as autoridades do México para que isso não passe incólume”, acrescentou.
Ela avalia que o caso dela chamou atenção por ser uma representante da comunidade LGBTQIA+ que seguia para um evento internacional, mas que esse tipo de violação é comum para pessoas trans. “Se a gente for observar isso é corriqueiro acontecer com pessoas trans quando vão a outros países. A gente tem mais retenções em aeroportos do que possa imaginar”, disse.
Transfobia institucional
Para Gustavo Coutinho, advogado e presidente da ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos), Keila foi vítima de transfobia institucional.
“É nítido que a deportação foi motivada por transfobia. Keila é uma travesti negra sem nome e gênero retificados nos seus documentos. A delegação brasileira é composta por 20 defensores e defensoras de direitos humanos cisgêneros e todos ingressaram no país apresentando a mesma documentação que Keila, sem maiores transtornos”, ressaltou o jurista.
O advogado intercedeu por Keila no México, mas não conseguiu impedir o retorno dela ao Brasil. Ele conta que, após ter negados os pedidos de informações na Imigração mexicana, foi informado pela companhia aérea que Keila de fato havia sido “inadmitida por inconsistências” no atendimento de ingresso no país.
“Com o auxílio da advogada da Red de Juventud Trans, Jessica Marjane, peticionamos à Comisión Nacional de Derechos Humanos solicitando medida cautelar para impedir o retorno de Keila ao Brasil. Muito embora a denúncia tenha sido recebida com urgência, não houve comunicação com a equipe do aeroporto em tempo hábil para impedir a deportação”, explicou.
“Comunicaremos as autoridades brasileiras e mexicanas, assim como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos para que seja feita retratação e que sejam tomadas as medidas cabíveis”, concluiu.
Universa tentou contato com a Embaixada do México no Brasil, por telefone e e-mail, para cobrar um posicionamento. No entanto, até a publicação desta matéria a entidade não havia se pronunciado. O espaço segue aberto para a resposta da embaixada.