MPF vai à Justiça para suspender resolução do CFM que limita tratamento de jovens trans
Ação movida no Acre pede a anulação da norma, que proíbe bloqueio hormonal em crianças e adolescentes, e multa de R$ 3 milhões ao Conselho por danos morais.

O Ministério Público Federal (MPF) no Acre ingressou com uma Ação Civil Pública na Justiça Federal para pedir a suspensão imediata de uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que impõe severas restrições ao acesso à saúde por crianças e adolescentes trans no Brasil. A ação, protocolada pelo procurador da República Lucas Costa Almeida Dias, classifica a norma como um retrocesso e um risco à saúde física e mental da população trans.
Publicada em abril deste ano, a Resolução CFM Nº 2.427/2025 proíbe médicos de prescreverem bloqueadores hormonais para crianças e adolescentes com incongruência de gênero. Além disso, a norma eleva de 16 para 18 anos a idade mínima para iniciar a terapia hormonal cruzada e estabelece que cirurgias de afirmação de gênero com efeito esterilizador, como a remoção de testículos ou útero, só possam ser realizadas a partir dos 21 anos.
Na ação de 101 páginas, o procurador argumenta que a resolução do CFM “vai na contramão de uma série de recomendações internacionais dos órgãos de proteção de direitos humanos”, citando o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos e o Comitê sobre os Direitos da Criança da ONU. O MPF destaca o “perigo do dano evidente” que a norma causa, ao impedir que jovens trans tenham acesso a tratamentos cruciais durante uma fase fundamental do desenvolvimento, o que pode acarretar “graves prejuízos à saúde e ao bem-estar”.
Pânico nas famílias e danos morais
O Ministério Público Federal solicita, em caráter de urgência, a suspensão total da resolução e a aplicação de uma multa de R$ 3 milhões ao CFM por danos morais coletivos. O procurador Lucas Dias informou no processo que “não aceita conciliar em razão da natureza dos direitos defendidos e a posição do Conselho na instrução desse inquérito civil”.
A ação reforça denúncias feitas por entidades como a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) e a Associação de Mães pela Liberdade de MG, que relataram o pânico gerado entre as famílias de crianças e adolescentes que já estavam em tratamento ou prestes a iniciá-lo. Segundo as associações, a suspensão dos procedimentos médicos acarreta um “prejuízo grave e até mesmo irreparável para a saúde das pessoas trans”, aumentando o sofrimento psíquico, a depressão e o risco de suicídio.
Para o MPF, ao limitar o acesso a tratamentos reconhecidos internacionalmente, o CFM impõe barreiras que violam o direito fundamental à saúde e à dignidade da pessoa humana, ignorando a autonomia e o bem-estar dos jovens pacientes e suas famílias.